OS JESUÍTAS
Data do ano de 1619, a primeira incursão em território gaúcho, pelo Padre Jesuíta Roque Gonzáles de Santa Cruz, às margens do Rio Uruguai, onde seria instalada uma das reduções Jesuítas no Rio Grande do Sul, a de São Nicolau. Como a videira e o vinho sempre estiveram presentes nas celebrações eucarísticas católicas, não haveria dúvida que esta cultura estaria presente no projeto de instalação das reduções. Há outros registros que Padre Roque as teria introduzido um pouco mais tarde, a partir de 1626. Das cepas trazidas não há registro. Mas, considerando a rota argentina das missões e a origem espanhola do padre, pode indicar que as castas seriam as descendentes da Tintilla, Criolla e Criolla Chica, também presentes em Rioja-Espanha.
“Com isso, nas culturas da Redução de São Nicolau estavam presentes vides viníferas e, à época da colheita, as atividades de elaboração do vinho, colocando o Padre Roque Gonzales de Santa Cruz como o precursor e pioneiro da viticultura rio-grandense”. (Memórias do Vinho Gaúcho / Rinaldo Dal Pizzol / Sérgio Inglez de Sousa. – 1. ed. – Porto Alegre, RS : AGE, 2014, 1. Vol.; página 40).
A estrutura das Reduções Jesuítas, em cada um dos Sete Povos, era constituída de uma igreja, colégio, convento e cemitério. Também havia a praça frontal para os grandes eventos, uma área cercada com muro de pedra, nos fundos, onde ficavam a horta, pomar e onde plantavam os demais cereais. Não faltava a área destinada ao parreiral, do qual se colhia a uva para o vinho – guardado nas adegas, situadas nos subsolos do refeitório – sempre de variedades europeias, posto que de lá era a procedência inicial das mudas.
O mesmo se replicava em toda a América Espanhola, com vários registros desta presença Jesuíta no Uruguai, Argentina e Paraguai, este como extensão das reduções brasileiras, posto que instaladas na mesma região geográfica, como pude constatar pessoalmente, em viagem que fizemos em meados de 2000, quando conhecemos boa parte deste belo e importante patrimônio histórico e arquitetônico das Missões.
Com a destruição das Missões Jesuítas pelos Bandeirantes, desapareceram as primeiras “vitis viniferas”, naquela época espalhadas por grande parte do solo gaúcho. Há indicações que os portugueses não queriam concorrência com o seu vinho, já exportado para o Brasil naquela época. Ficaram muitas histórias e algumas lendas, como a do Sepé Tiaraju.

Ruína da Missão Jesuítica de São Miguel das Missões-RS
OS AÇORIANOS
Entre 1742 (ou 1732) a 1773, (1732 a 1773, diz Inglez de Souza) os recém-chegados imigrantes portugueses, notadamente da Ilha dos Açores, conseguiram promover a implantação de parreiras, partindo de Rio Grande, nos arredores da Lagoa do Patos, e chegando até os arredores de Porto Alegre, com castas de origem portuguesas e francesas. Esta foi a segunda grande tentativa de implantação de vinhedos regulares na região, e esta missão até que foi relativamente bem-sucedida:
“... a videira frutifica em abundância e perfeição; mas o vinho não merece ainda o nome de passageiro, também ainda não se fizeram diligências para melhorar.” (Aires de Casal, em 1817, referindo-se a Porto Alegre, em 1817).
UVA ISABEL
Após as duas tentativas de introduzir as “vitis viniferas” no Rio Grande do Sul e Brasil, pelos Jesuítas e Açorianos, com o surgimento, nos Estados Unidos, de grandes vinhedos de espécies nativas, pela simples razão de que estas vinhas já haviam salvo as variedades europeias do Oídio , coube à variedade Isabel, fazer história também no Brasil.
Ingressou em São Paulo, entre os anos de 1830 e 1840, por obra do inglês John Rudge, na Fazenda Morumbi, espalhando-se pelas cercanias, especialmente Mogi das Cruzes, São Roque e Jundiaí, ganhando maior impulso ainda com a chegada dos imigrantes italianos, imediatamente após a abolição da escravatura, havida em 1888. Em 1919, os mesmos irmãos introduziram a Seibel 2, trazidas da Europa em substituição paulatina da Isabel.
“Em 1894, Benedito Marengo e seu filho Francisco Marengo introduzem, dos Estados Unidos, precisamente Alabama, a videira Niágara Branca, logo promovendo sua disseminação em larga escala pelos quatro cantos do Brasil, a partir do começo do Século XX. Essa variedade, em São Paulo, foi pouco a pouco desbancando a Isabel, que dominava o mercado de uva para mesa – vendida em cestas forradas com grandes folhas de parra – inaugurando, assim, um novo estilo de comércio de uva, baseado em variedades de bagas brancas.”
No Rio Grande do Sul, no ano de 1839, o gaúcho Marques Lisboa, remeteu de Washington-EUA, bacelos da variedade Isabel, ao comerciante Thoms Messiter, que formou o primeiro parreiral desta variedade americana na Ilha dos Marinheiros, em Porto Alegre. Em torno de 1860, a Isabel já era predominante nos vinhedos de Pelotas, Viamão, Gravataí, Vale dos Sinos, Montenegro e Rio Pardo, nas margens do Rio Jacuí. Nesta mesma época, diante da grande produção, o vinho da variedade Isabel era embarcado para o Porto de Santos e ao Rio de Janeiro.
Nome histórico para os gaúchos, o Cel. Alberto Bins, também deputado estadual, entre os anos de 1900 e 1930, em Gravataí, arredores de Porto Alegre, chegou a cultivar 72 espécies de parreiras, destacando-se Merlot, Malbec e Traminer.
A variedade Isabel, mesmo com todas as deficiências no seu rendimento para um bom vinho, era a que tinha a melhor adaptação às condições climáticas e foi a primeira casta americana introduzida na Europa, África e Ásia, começando por Nice, França e na Argélia.
Relatos menos precisos indicam que Martin Afonso de Souza, quando fundou a Capitania da São Vicente, em 1532, teria introduzido vinhas, trazidas da Ilha do Açores e seu amigo, Brás Cubas, seria o primeiro a produzi-lo, nos campos de Piratininga-SP, por volta de 1551. Em 1680, os mesmos portugueses tentaram plantar videiras em Minas Gerais e Pernambuco.
(Introdução que não constou no livro #entreosmolossieovinho porque nos limitamos aos imigrantes italianos),
Curitiba, abril de 2021.